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Manifestantes de todo o Brasil se concentraram, desde o início da tarde desta quinta-feira (31), no Estádio Nacional Mané Garrincha, em um ato em defesa da democracia e contrário ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Após isso, os manifestantes fizeram uma caminhada até o Congresso Nacional. Eles estimam 100 mil pessoas; a Polícia Militar fala em 50 mil.

Representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) na Frente Brasil Popular, Janeslei Aparecida de Albuquerque diz que haverá atos em todos os estados e em centenas de cidades do interior. “Brasília, por ser a capital do país, é fundamental para dar visibilidade à nossa insatisfação com o golpe que está sendo aplicado contra o Brasil. Motivo pelo qual entre 700 e mil ônibus vieram para cá, vindos de todos os estados brasileiros”, disse à Agência Brasil.

“O que queremos é barrar esse golpe porque sem crime de responsabilidade esse impeachment é golpe. Em relação às pedaladas, trata-se de remanejamento de recursos públicos. Algo que é feito por todos governos nas esferas federal, estadual e municipal. Portanto nada tem a ver com qualquer desvio de recursos”, disse a representante da CUT.

“Está muito claro para cada vez mais pessoas que o que acontece é que quem perdeu a eleição não tem espírito republicano nem democrático. Este é o papel histórico de entidades como a Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], entidade que sempre agiu contra a classe trabalhadora, arrancando sangue e a mais-valia e sem dar retorno justo ao trabalho”, disse a sindicalista.

As palavras de ordem dos líderes do movimento, que falavam ao microfone em sete carros de som que estavam no estacionamento do estádio, ecoavam também nas vozes das milhares de pessoas concentradas, entre elas, a trabalhadora rural Cristiane Rocha Oliveira, 33 anos. Ela passou três dias viajando desde Piripiri (PI) até Brasília, em um ônibus com 48 pessoas. “A gente está cansado das mentiras que vimos na televisão, e viemos até aqui para mostrar que em muitos lugares do país a Dilma é bastante popular pelo muito que fez para melhorar a vida da gente”, disse ela à Agência Brasil.

“Desde que o Lula foi presidente, muita coisa boa aconteceu na minha cidade, principalmente nas escolas. A vida melhorou 100%. A alimentação, a saúde. Há três meses consegui a minha casa [pelo Programa Minha Casa Minha Vida] e parei de pagar aluguel. A Dilma trata o pobre como ninguém antes tratava, e gastar com pobre é um gasto mais digno do que o gasto com o rico, porque é a gente quem precisa”, disse.

As dificuldades de locomoção do cadeirante Marco Borges, 58 anos, não o desanimaram a embarcar em uma viagem de 650 quilômetros – distância entre Santana (BA) e Brasília. “Vale o sacrifício porque minha missão é ajudar a defender a democracia de meu país. Democracia que foi conquistada com muito custo após 1964. O mundo mudou e os tipos de ditaduras também. Agora nosso risco é o de viver uma ditadura judiciária respaldada por uma mídia pra lá de comprometida. É um absurdo a Dilma, que nem investigada é, ser refém de uma pessoa comprovadamente corrupta como o Eduardo Cunha”, disse o aposentado.

“E não podemos aceitar que o [Michel] Temer se torne o principal e mais importante personagem de nosso país, quando ele só está na vice-presidência graças à Dilma. Ele deveria ajudá-la, e não golpeá-la”, acrescentou o cadeirante que veio acompanhado de um grupo de 50 pessoas. “O Luz para Todos levou a nossa cidade também o acesso à internet. Isso deixou nossa cidade mais bem informada e consciente de que o Brasil é muito diferente.”

Operador de trator, Salvador Gregório, 52 anos, viajou mais de 400 quilômetros vindo de Coromandel (MG) na companhia da esposa, que não quis se identificar. “Estão querendo tirar nossa presidenta e a gente não aceita”, disse. “Vou lhe falar uma coisa: o que o Lula, e depois ela, fizeram para a gente ninguém nunca fez. Em primeiro lugar, eles nos respeitam. Tratam pobre que nem rico. Melhorou a renda lá de casa e a gente espera que isso continue porque a gente precisa ter uma terrinha e parar de pagar aluguel”.

O coordenador da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), José Carlos Padilha Arêas, diz que a luta para garantir e dar estabilidade ao governo Dilma tem por objetivo a continuidade dos avanços dos direitos sociais dos brasileiros. “Estão usando a crise mundial pela qual passa o capitalismo para prejudicar o Brasil, a exemplo do que fizeram com a Grécia. Esse projeto que o Temer já vem propagandeando, chamado de Ponte para o Futuro, é também um golpe contra os avanços sociais no Brasil”, argumentou.

A economista Clara Sanchez, 28 anos, veio do Rio de Janeiro “para mostrar ao mundo que os brasileiros estão cientes de que a democracia está sob risco, caso o impeachment seja aprovado”.

A escolha por participar das manifestações em Brasília se deve ao fato de, pela proximidade com o Congresso Nacional, a capital facilitar um contato direto com os parlamentares que traçarão o destino do país. “Quero dizer a eles que não será fácil dar esse golpe. Nós temos capacidade de mobilização e vamos mostrar o quão irresponsável seria a deposição de uma presidenta”, disse.

Manifestações em São Paulo

O ato em defesa da democracia e contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff ocupa a Praça da Sé e a rua lateral da catedral, no centro da capital paulista. Organizado pelo movimento Frente Brasil Popular, o ato foi batizado de “Em Defesa da Democracia, Golpe Nunca Mais”.

Quatro carros de som levam líderes de movimentos sociais e de sindicatos que se revezam nos discursos.

Entre os manifestantes, há balões e bandeiras de entidades, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), da União da Juventude Socialista, da Central de Movimentos Populares, além de sindicatos de diversas categorias.

As pessoas carregam bandeiras e faixas com o nome de Dilma e com a hashtag DilmaFica, além de mensagens contra o impeachment e contra o que chamam de golpe.

O professor Daniel Eid Garcia, 41 anos, diz que participou de todas as manifestações contra o impeachment este ano. Ele disse que veio ao ato de hoje para reforçar a ideia de que a sociedade não pode aceitar o impedimento da presidenta. “O método [atual] configura golpe, não há sustentação jurídica para o impeachment”, disse.

O coordenador da Central de Movimentos Populares, Raimundo Bomfim, concorda com a avaliação. “Está claro que não tem embasamento jurídico [para o impeachment], a presidenta Dilma não cometeu crime de responsabilidade, será um golpe se isso ocorrer. Nós estamos confiantes que não vai ocorrer. E se ocorrer, o [vice-presidente] Michel temer já começa um governo deslegitimado”, disse.

“O que está em jogo não é simplesmente derrubar a presidenta Dilma, o que está em jogo é um movimento de retirada de direitos trabalhistas e de eliminação de programas sociais. Com as forças políticas que estão acenando para um eventual governo Temer, a situação dos trabalhadores não vai melhorar”, destacou.

“[Num eventual governo Temer] vai é piorar a situação dos trabalhadores e da população mais pobre porque vai retirar direitos. Toda vez que entra em crise, o andar de cima fica com a fatia maior, e quem paga a conta são os trabalhadores. Mesmo em um governo Dilma, comprometido com os setores populares, isso já está acontecendo”, disse Bomfim.

Também participam do ato a Frente das Mulheres pela Democracia, a Frente Brasil Sem Medo, e a Marcha Mundial das Mulheres. A palavra de ordem mais cantada é “Não Vai ter Golpe”. Uma grande faixa erguida por um balão traz os dizeres: “O Pré-Sal é Nosso Só com a Partilha”. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é criticado pelos manifestantes.

“Nós, as mulheres, pedimos o fora Cunha, esse corrupto, que prega a injustiça, a favor da morte das mulheres. E essa direita golpista que, ao tentar dar a golpe e destruir a esquerda, não contava com a nossa capacidade de luta. O que eles fizeram foi fortalecer a nossa luta. Seu machismo chulo contra a Dilma fez com que as mulheres do país se erguessem todas. Sairemos fortalecidos desse embate”,  disse a coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, Nalu Faria.

Manifestações no Rio de Janeiro

Os manifestantes se reuniram no Largo da Carioca, no centro do Rio. Na avaliação do presidente da Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj), Rossino Castro Diniz, a camada mais pobre do país, beneficiária dos principais programas sociais do governo, como Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida, é contrária à tentativa de impedimento da presidenta Dilma.

“Isto que está acontecendo aqui é só o início, porque o povo ainda está se conscientizando e o pessoal de favela demora mais para entender o que está ocorrendo. Quando eles forem botar [o impeachment] em votação, nós vamos colocar mais de um milhão de pessoas em Brasília. Os programas do governo beneficiaram a classe menos favorecida, o povo da favela. Quando eles entenderem que podem perder isso, o caldo vai engrossar. E você pode ter certeza, não vai ter golpe”, disse Diniz.

Durante a manifestação, alguns participantes compararam o atual momento político do país às crises vividas pelos ex-presidentes Getúlio Vargas, em 1954, e João Goulart, em 1964. Para a professora de história aposentada Lúcia Miranda Boaventura, por trás dos golpes políticos sempre estiveram o capital internacional e as elites locais.

“Os interesses internacionais não querem admitir um país forte no Hemisfério Sul. Hoje, a elite que está no domínio é a financeira, que ganha fortunas na especulação e não gera empregos. É o dinheiro dela que sustenta parte desse Congresso e que deixa esses políticos milionários”, disse.

Para o diretor de base do Sindicato da Construção Civil de Volta Redonda, Evaldo Antônio de Oliveira, um dos riscos de um eventual golpe político é a perda de direitos dos trabalhadores, principalmente quanto às garantias previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

“Eles querem tirar os nossos direitos. Se sair a Dilma, nossos direitos vão embora. O trabalhador está preocupado com isso. Se tiver esse golpe, vai ser pior para a economia.”

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