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Moisés há um ano prega em praças, vias e logradouros públicos.

O às vezes duro mandamento eclesiástico “ide por todo o mundo e pregai o evangelho…”, tão decantado e que para muitos dos seus supostos praticantes tem servido como pretexto para ações questionáveis nos seus méritos, como viagens intermináveis e arrecadações sombrias de aplicação duvidosa, foi visto sendo praticado legítima e despretensiosamente – sob ponto de vista pessoal – na manhã calorenta deste domingo, na área da feira livre, no bairro Timirim, em Timóteo. Sob uma temperatura insuportável e um sol com a intensidade daquele que inspira a popular expressão “de rachar mamona”, um jovem, que se identificou para nossa reportagem como Moisés Carlos Silva, de 22 anos, e que disse pertencer à Assembleia de Deus do bairro Canaãzinho, em Ipatinga, ligada ao ministério Pr. Antônio Rosa da Silva, por volta das 10h40 chegou ao local, em uma motocicleta, cor preta, em cuja garupa carregava uma caixa de som e equipamentos pertinentes, daqueles longe de serem de última geração. Com um olhar de muita concentração, o rapaz procura um espaço em um ponto estratégico para colocar a caixa e fazer seu “púlpito”,  ali o próprio chão que todos seus semelhantes pisam. Anda poucos metros e localiza uma área próxima ao ponto de ônibus, na Av. Monsenhor Rafael. O jovem, de semblante cansado, mas não abatido, instala o serviço de som, verifica a garrafa d’água que carrega e inicia sua pregação. Antes, improvisa uma “mesa” em uma pilastra para deixar a bíblia aberta no trecho sobre o qual iria pregar. Vai falar Moisés. Como um profeta o moço abre a boca e destila sua mensagem.

O sol parecia esquentar-se mais a cada minuto que passava. O suor começa a escorrer pela face do profeta abnegado, anônimo e sem fome de fama, sem “peso” social,  sem estrela. Sua camisa, já molhada de suor, estava colocada ao corpo. Com excelente dicção, ele prega com autoridade e deixa, logo no início do  sermão,  evidente sua condição de “bom de Bíblia”. Os populares passam de largo e o pouco caso com a mensagem do rapaz marca o comportamento de quase todos que transitaram pelo trecho onde Moisés estava, como em um deserto. Alguns sequer olhavam na direção do pregador, que não pregava barganha ou coisas que o valham. Um rapaz, que aguardava um dos ônibus que servem as linhas do município, fica como que admirado. Aproximamos dele e este diz: “aquele é crente, mesmo. Tem que ter muita coragem para fazer o que ele está fazendo”. O que Moisés estava fazendo?  O mensageiro do evangelho advertia para a proximidade da volta de Jesus. Condenava a idolatria e a falta de tempo alegada por muita gente como álibi para não fazer nada para Deus nem buscar fortalecer a fé. Uma pausa e um gole de água, que parecia estar tomada pelo gelo. Uma olhada na bíblia e a continuidade da mensagem, mensagem viva, dita com a força dos pulmões de quem acreditava que seu esforço não seria vão no Senhor. Em outra pausa,  para mais uma molhada de garganta,  nos aproximamos do pregador e lhe fizemos algumas perguntas. Moisés, entreolhando por detrás de grossos filetes de suor que quase cobria-lhe a face toda e salpicava de gotas as pontas dos parcos fios do bigode, disse que há 1 ano vem pregando o evangelho em praças públicas, vias e logradouros, voluntariamente. Isto mesmo que você leu: vo-lun-tá-ri-a-mente. Durante este período  já esteve em Caratinga, João Monlevade, Mesquita, Joanésia, dentre outras cidades, para onde vai em sua motocicleta, “veículo que o Senhor nos deu”, como disse. Sobre o apoio de lideranças ao seu trabalho, o moço, vestido singelamente, porém de modo social, afirmou que muitas vezes na hora de um culto evangelístico as pessoas desanimam, sugerindo que fica sozinho na realização destes eventos. Ele foi prudente na resposta, o que nos permitiu traduzir uma possível resposta à pergunta específica. O rapaz que tem nome de um profeta revelou que Deus tem lhe agraciado com conversões e outras bênçãos decorrentes da sua atitude de pregar da forma como prega. Encerramos nossa conversa e Moisés voltou ao microfone para dar continuidade à sua mensagem. Moisés mirou contra contra o pecado. Metralhou a injustiça e detonou com a negligência e o farisaísmo que permeiam a sociedade.

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O pregador que estava ali na feira livre na manhã deste domingo, foi alvo dos olhares de algumas pessoas que o encaravam  como se vissem na sua iniciativa um ato de tolice. Para os padrões adotados por uma banda podre do mundo que vem sendo chamado de gospel, até que era tolice, sim. Ele não tinha ali um púlpito opulento, um holofote, água mineral, bajulação e palmas frenéticas. Não carregava uma valise nem mostrava seu sapato multicor. Seu nome não era aclamado e ninguém, no final, disputou uma foto ao seu lado para ser postada nas redes sociais. O público que o assistia não era formado por ovelhas forçadas a estarem em determinado lugar, com locomoção garantida, como modo de subtrair possíveis justificativas de ausência. Moisés assistiu à escola bíblica dominical na sua congregação em Ipatinga para, depois, deslocar-se até Timóteo, atitude fora de moda para incautos e metidos a celebridades. Seu destino para a semana não está traçado pelas agendas negociadas, vendidas e leiloadas no “quem da mais”. Ele, conforme nos contou, pede a direção de Deus que o encaminha aos lugares onde vai. A gasolina da motocicleta não é fruto de assalto aos gazofilácios. É fruto do toque de Deus em algumas pessoas que se sensibilizam com sua causa. Moisés não reclamou do valor da oferta, da oferta que não tem, da oferta que não teve, da oferta que não pede, da oferta que não exige. Antes de pregar não teve que negociar com ninguém a forma de recompensa pelo que ia falar. O moço disse que confia na providência de Deus. Moisés escolheu o “deserto” por acreditar que seu Mestre lhe dará a terra prometida. Mesmo que não tenha uma Miriã para cantar do outro lado, o profeta Moisés não desiste do que faz, porque o faz acreditando que um dia estará cantando do outro lado. Nem tudo está perdido.

Assista à parte da pregação do Moisés.

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